O mundo mudou muito nos últimos 100 anos. Avançamos na medicina, nas ciências e na tecnologia. Descobrimos novas vacinas, melhoramos a nossa higiene, melhoramos as leis trabalhistas, criminalizamos a misoginia, o racismo e a homofobia.
Mas, será que evoluímos tanto assim como humanidade? Ainda vemos tantos casos de racismo não declarado, de misoginia ou etarismo, entre outros preconceitos, que às vezes parece que não saímos do século XIX. Temos a impressão que damos um passo para a frente e dois para trás.
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Este ano, li diversos livros que me fizeram pensar sobre empatia, ou em alguns casos, sem nem mesmo conseguir imaginar como seria estar no lugar dessas pessoas...
Um livro que me fez sentir a realidade dos negros no período da escravidão foi "Um defeito de cor", de Ana Maria Gonçalves. A escritora fala sobre a forma em que eles foram escravizados no início do século XIX, sobre o modo cruel em que foram trazidos nos navios da África para a América, sobre como eram tratados pelos seus patrões e como tiveram que abdicar da sua cultura, da sua religião e até do seu nome para se moldarem ao que o branco considerava correto.
A escravidão velada vivida na época pós-abolição também é tratada no livro "Torto Arado", de Itamar Vieira Junior, que relata a história de uma família que trabalha em uma fazenda no Nordeste do Brasil. Apesar de não serem considerados escravos e viverem do trabalho nas fazendas, não recebiam salário, não possuíam liberdade de ir e vir e muito menos oportunidades de sair daquela vida para outra melhor.
Já o livro "O avesso da pele", de Jefferson Tenório, descreve a realidade de como é ser um negro no Brasil nos dias atuais, de ser sempre tomado por um ladrão, um usuário de drogas ou um mau caráter, mesmo que você esteja somente caminhando tranquilamente pela rua. Não consigo imaginar as dificuldades pelas quais essas pessoas passam, apenas por terem uma cor de pele mais escura. Se privam de oportunidades de trabalho, são julgadas quando entram em um restaurante ou em uma loja e são presas (ou mortas) sem nenhuma justificativa.
Não é à toa que estes foram considerados os três melhores livros brasileiros do século XXI.
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Saindo um pouco da temática racial, também li "Trinta segundos sem pensar no medo", de Pedro Pacífico, em que ele descreve como foi difícil se assumir como um homem homossexual, principalmente pela expectativa da sociedade de que ele se casasse com uma mulher e tivesse filhos. Ao tentar atender a essas expectativas e se encaixar no "padrão" que lhe era imposto, teve diversas crises de ansiedade, até que ele conseguisse se entender, e entender por que estava sentindo tudo aquilo.
Já no livro "As impacientes", a camaronesa Djaïli Amadou Amal faz com que nos coloquemos no lugar de três mulheres muçulmanas, que são obrigadas a se casar com o homem que sua família escolhe para elas, a aceitar tudo o que os maridos fazem (sejam eles bons ou maus), e ainda por cima a ter muita paciência...
A religião também é tema de "Hibisco Roxo", da diva nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. Porém, neste caso, a história relata como a imposição do catolicismo em um país africano pode gerar um fanatismo religioso, se voltando contra a própria origem e a cultura africanas para endeusar tudo o que vem do homem branco europeu.
Eu poderia listar aqui muitos outros livros que me fizeram praticar a empatia...
Mas vou me ater à ideia de que os livros nos trazem um conhecimento gigante sobre essas outras realidades, e é esse conhecimento que permite nos colocarmos no lugar dessas pessoas e sentir o que elas sentem. É esse conhecimento sobre a diversidade que nos traz outras perspectivas e nos ajuda a respeitar outras culturas, outras religiões ou outras orientações sexuais diferentes das nossas.
Além disso, o conhecimento obtido através da literatura também nos traz alteridade, que é a capacidade de entender a individualidade do outro e respeitar as diferenças. E, no dia-a-dia, isso significa ter a capacidade de aceitar as opiniões das pessoas que pensam de forma diferente da sua, sem julgamento ou polarização.
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